Porque lançamos o Grupo de Haia
Cyril Ramaphosa, Anwar Ibrahim, Gustavo Petro e Varsha Gandikota-Nellutla
Caro amigo,
Há mais de 500 dias, Israel, com o apoio de nações poderosas que lhe fornecem protecção diplomática, armamento e apoio político, tem violado sistematicamente o direito internacional em Gaza. Esta cumplicidade representou um golpe devastador à integridade da Carta das Nações Unidas e nos seus princípios fundamentais quanto aos direitos humanos, igualdade soberana e proibição do genocídio. Um sistema que permite a morte de cerca de 61.000 pessoas não está apenas a falhar—já falhou.
As provas, transmitidas em directo para os nossos telemóveis e avaliadas pelos mais altos tribunais do mundo, são inequívocas. Desde a opinião consultiva do Tribunal Internacional de Justiça sobre a ocupação ilegal dos territórios palestinianos até aos mandados de captura emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) contra os mais altos líderes israelitas, passando pelas medidas provisórias decretadas no âmbito do processo por genocídio movido pela África do Sul, as acções de Israel constituem violações claras do direito internacional.
No entanto, apesar destas decisões, as violações persistem, facilitadas por nações que desafiam abertamente os principais tribunais internacionais—impondo sanções a funcionários, empregados e agentes do TPI e desafiando publicamente as suas ordens.
O ataque contra o povo palestiniano ecoa capítulos sombrios das histórias dos nossos próprios países—o Apartheid na África do Sul, a contra-insurgência na Colômbia e o domínio colonial na Malásia. Estas lutas recordam-nos que a injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo o lado. Podemos vir de continentes diferentes, mas partilhamos a convicção de que a complacência equivale a cumplicidade nestes crimes. A defesa do direito inalienável do povo palestiniano à autodeterminação é uma responsabilidade colectiva.
É por isso que, juntamente com a Bolívia, Cuba, Senegal, Honduras e Namíbia, lançámos o Grupo de Haia, uma coligação comprometida em tomar medidas decisivas e coordenadas para garantir a responsabilização pelos crimes de Israel.
Os três compromissos inaugurais do Grupo de Haia são guiados por dois imperativos fundamentais: o fim da impunidade e a defesa da humanidade.
Os nossos governos cumprirão os mandados emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) contra o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, e o ex-Ministro da Defesa, Yoav Gallant, sublinhando a importância de investigações e processos adequados, justos e independentes, a nível nacional ou internacional. Impediremos que navios que transportem material militar para Israel utilizem os nossos portos e bloquearemos todas as transferências de armas que possam facilitar novas violações dos direitos humanitários.
Num mundo interligado, os mecanismos da injustiça encontram-se no próprio tecido das cadeias globais de abastecimento. As armas mais avançadas não podem ser fabricadas sem metais, componentes, tecnologia e redes logísticas que atravessam continentes. Ao coordenarmos as nossas políticas, pretendemos erguer uma barreira de defesa do direito internacional.
Acreditamos no protagonismo, não na súplica. A escolha é clara: ou agimos juntos para fazer cumprir o direito internacional, ou arriscamo-nos a assistir ao seu colapso. Escolhemos agir—não só pelo povo de Gaza, mas pelo futuro de um mundo onde a justiça prevaleça sobre a impunidade.
Que este momento marque o início de um compromisso renovado com o internacionalismo e com os princípios que nos unem enquanto comunidade global.
Em solidariedade,
Cyril Ramaphosa, Presidente da África do Sul.
Anwar Ibrahim, Primeiro-Ministro da Malásia.
Gustavo Petro, Presidente da Colômbia.
Varsha Gandikota-Nellutla, Coordenadora-Geral da Internacional Progressista e Presidente Interina do Grupo de Haia.